sábado, 27 de novembro de 2010

O “primeiro eu”, o “segundo eu” e a hibridação entre eles


No período que se estende entre o século XIX e primeira metade do século XX, o eixo em torno do qual se constrói o que é cada sujeito era em torno da “interioridade” do indivíduo, tendo como exemplo uma máxima que dizia “o que importa é a beleza interior” e o que esta do lado de fora seria apenas uma carcaça que sustenta essa dita essência pessoal. Após a segunda metade do século XX e, sobretudo em seu fim, surgiu um fenômeno novo a maior parte da população denominada Internet. Este fenômeno iniciou-se primeiro com conexões entre computadores em redes de curta distancia, abrangendo os limites das cidades, depois países e após isto global, inicialmente graças à difusão da utilização das fibras ópticas. Junto com o desenvolvimento da internet foram se desenvolvendo paralelamente o uso da mesma na comunicação entre seus usuários, gerando a primeira forma de comunicação em larga escala conhecida como IRC (Internet Relay Chat), no qual as pessoas de todo o mundo começaram a interagir entre elas de forma mais rápida e fácil, diminuindo ai aquelas antigas distancias entre um e outro lado do mundo. Com a utilização dos princípios dessa ferramenta foram construídos outras formas de chat mais populares para abranger maior parte da população que utiliza-se de informática e internet, sem necessariamente precisarem ter maiores conhecimentos para utilizar esta mesma ferramenta como alternativa para se comunicar com outras.

No inicio do século XXI a internet continua se desenvolvendo cada vez mais rápido e com isto foram aparecendo varias ferramentas para a comunicação interpessoal, porem apesar de a internet ser uma grande ferramenta facilitadora na comunicação de um indivíduo desconhecido com outro também desconhecido em diferentes lugares do mundo ela não comunicava por si só de onde e como cada um era, alterando por este ponto o eixo que era mais voltado para o “interior”, para agora o seu “exterior” e os inícios de diálogos já iam refletindo as curiosidades dos indivíduos quem iam interagindo entre eles. As perguntas iniciais costumavam ser “age/sex/country”, idade/sexo/país, e após isto os relatos de como cada um era fisicamente, despertando assim a construção do físico de um no imaginário de outro, mas ate certo período ainda se mantinha esta espécie de equilíbrio do eu tanto “interior” quando “exterior” apresentados ao outro, neste período as ferramentas de internet mais comum eram o ICQ, que era voltado para um publico que tivesse mais facilidade com informática e tinha um visual mais seco, sendo então voltado mais para o publico masculino tendo uma desproporcional quantidade de homens com relação as mulheres. Surgiu após esta ferramenta o MSN, com visual mais suave e mais fácil de mexer, sendo este voltado mais para o publico feminino, que geralmente tinha mais dificuldade de utilizar ferramentas de comunicação, e com reação a isto o publico masculino migrou para esta nova ferramenta, para se aproximar-se mais do publico feminino.

Devido à grande difusão da internet neste inicio do século XXI e com isto as diferentes variações de utilização do mesmo como ferramenta de comunicação interpessoal, começou a ocorrer um fenômeno por parte de alguns usuários na criação de personagens que infestavam os imaginários de outros usuários e com a aceitação disso e com a necessidade individual de ser visto pelo outro como alguém que existe no mundo e também como contrapartida ao afastamento na realidade física entre os indivíduos, essa forma de se mostrar para o outro um “eu” exterior que a principio não existe, mas de fato existe tanto no imaginário de quem o cria quanto no imaginário de quem recebe a descrição do mesmo, vem se difundindo cada vez mais. Com isto este “segundo eu” criado pelos usuários foi tomando uma forma “interior” para preencher a forma “exterior” existente neste mesmo e com o terreno já preparado surgem às redes sociais no qual as pessoas criam perfis tanto de seu “primeiro eu”, aquele que o individuo acredita ser tanto dentro quanto fora, os profiles de seu “segundo eu”, aquele que o individuo cria com conteúdo tanto interior quanto exterior de um personagem imaginário, servindo este como objeto de satisfação e realização do individuo e toda visibilidade que este obtém acaba por refletir no próprio individuo criador que acaba por se satisfazer como existência física a partir desse “segundo eu” e mais recentemente vem surgindo perfis híbridos que geralmente são formados pela união do primeiro e segundo eu do individuo, gerando em alguns momentos interiorização de alguns desses componentes criados no próprio individuo criador.

A aplicação dos conceitos de Edgar Morin na vida acadêmica e profissional enquanto psicólogos


Edgar Morin apresenta através de um conjunto de idéias um paradigma denominado Pensamento Complexo, podendo esse ser aplicado na vida estudantil ou mesmo numa intervenção psicológica. O entendimento de “complexo” aqui seria aquilo que não é redutível a uma única abordagem ou visão, ou seja, é aquilo que se apresenta de forma multidimensionalmente, etimologicamente significa “aquilo que é tecido em conjunto” (do latim complexus).

Na busca de uma conceituação do Pensamento Complexo, Morin se depara com três macro-conceitos: O princípio dialógico, nele subentendendo-se que devemos, em nossas explicações, assumir e utilizar duas lógicas concorrentes, contraditórias até, e não apenas uma. O segundo é o princípio da recursão organizacional, sendo este regido pela causa-efeito, não somente ditando que a causa produz efeito, mas que o efeito também produz ou retroage sobre a causa. O terceiro e ultimo é o princípio hologramático, no qual diz que a parte está no todo assim como o todo esta presente na parte, não havendo uma dissociação entre parte e todo e que a totalidade não é meramente a soma das partes, ela é sempre aberta e distinta.

Morin discorre também sobre a ordem tetralógica de todo sistema vivo (ordem, desordem, interação, (re) organização); os sete saberes necessário; e as recusas fundamentais. Contudo o foco será dado no quinto saber (dentro os sete saberes necessários), a incerteza. Apesar de, nas escolas, o ensino ser baseado somente nas certezas, como se a ciência fosse à verdade absoluta e a história fosse feita de forma linear e progressista. “A tomada de consciência da incerteza histórica acontece hoje com a destruição do mito do progresso. O progresso é certamente possível, mas é incerto” (MORIN, 2000, p.80).

Na psicologia, tanto quanto em outra área deve-se reconhecer a incerteza e sobretudo a incerteza do conhecimento, afinal, por mais que a psicologia tenha como foco principal ajudar o homem a resolver ou ao menos amenizar seus problemas de ordem psíquica ela não é uma verdade absoluta no qual os estudantes/profissionais da área de psicologia deve se ancorar de forma absoluta. É claro que é importante se aprofundar numa das escolas especificas, mas uma das coisas que deve se ter em mente é que cada uma delas tem uma forma de tentar interpretar o mesmo ser humano, não tornando, assim, uma melhor ou “mais certa” que a outra e sim uma maneira de analisar o mesmo homem.

O estudante/profissional nesta área além de ter que reconhecer que a sua ciência é incerta e portanto sucetivel a falhas como qualquer outra forma de pensar existente, tem que procurar conhecer e trabalhar outras áreas em conjunto com ela, com o intuito não somente de amenizar a incerteza do proprio conhecimento em psicologia, mas também para facilitar o trabalho com algum cliente ou mesmo lidar com a vida cotidiana. Logo não se deve considerar o indivíduo de forma isolada para somente a partir disso auxilia-lo e sim ter em mente que essa pessoa faz parte de um todo, tanto ela quanto o psicologo são parte de um todo, que intitulamos como sociedade. Faz-se necessário procurar conhecer o contexto socio-econômico que esse ser humano vive e não simplesmente começar a trata-lo da porta do consultorio para dentro (ignorando maior parte de sua vida, cotidiano ou crenças). É importante sobretudo valorizar outras formas de conhecimento e não somente a ciência, afinal, ela não é o conhecimento absoluto do mundo e sim uma das visões de mundo, que por mais que seja o de maior força nos dias de hoje, não significa que é uma certeza absoluta (basta lembrar os tempos em que o pensamento religioso era o dominante e egocentricamente se colocava como verdade absoluta), logo não devemos ter essa mesma prepotência de achar que a ciência é uma verdade absoluta e sim aceitar as incertezas e se ver como uma espécie de membrana que retem varios tipos diferentes de conhecimentos e aprender a trabalha-los juntos como parte de um todo ao invés de pedaços isolados. Não somos razão pura ou emoção pura, a arte por mais que tenta explicar sem palavras o inexplicavel, não seria nada se não fosse capaz de dialogar com a ciência ou religião e sobretudo não soube-se admitir a sua propria incerteza.

Referências

MORIN, Edgar. A cabeça bem-feita. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1999, p. 13-33.

MORIN, Edgar. Os sete saberes necessários à educação do futuro. Tradução de Catarina Eleonora F. da Silva e Jeanne Sawaya. 2 ed. Brasília, DF: UNESCO, 2000. Capitulo 5. P.80.